segunda-feira, 4 de julho de 2016

Coluna do Sarney: “o mês, mais uma vez, foi triste”

São Marçal

Lembrei outro dia que o São João do Maranhão tem várias marcas. A primeira, da forma tradicional vinda dos Açores, com grande marca portuguesa. Até o boi eles tinham na ilhas de onde vieram os primeiros emigrantes para o Maranhão. Lá era mais um boi pequeno, muito assemelhado ao chamado boi de mamão, como sobrevive até hoje em Santa Catarina.
Mas as festas juninas portuguesas eram mais marcadas pelas danças de roda e pelas quadrilhas. Carlos Lima foi quem melhor estudou o nosso boi, que foi boi-bumbá e definitivamente ficou como BUMBA-MEU-BOI. O São João de outrora girava, em quase todas as casas, em torno da fogueira, com as danças de sempre. Com as mãos cruzadas em cima se jurava amizade, no ritual do compadrio.
Depois — coisa dos últimos trinta anos — agregaram-se as festas reunindo São João, São Pedro e São Marçal. São João, discípulo amado de Jesus, que repousava sua cabeça do peito do Mestre; São Pedro, o chefe da Igreja; e para São Marçal procura-se encontrar explicação de porque ressuscitou sua devoção em São Luís. Sua biografia é de poucos dados, com a lenda de que segurou a toalha com que Cristo enxugou os pés dos Apóstolos na última ceia. Tornou-se santo pela voz do povo, no século VI. O certo é que as festas de junho terminam com seu dia, 30, que atualmente é feriado municipal. Mudou-se o nome da antiga avenida do João Paulo para São Marçal, por lei seu dia é o Dia Nacional dos Brincantes de Boi, e ele é padroeiro dos bombeiros. Sobre São Marçal criaram-se várias histórias: que foi discípulo de Jesus, que assistiu à ressurreição de Lázaro… Chegaram a pedir ao Papa Pio IX que o declarasse apóstolo, mas ele se negou a aceder ao pedido.
No Maranhão dizem que a devoção — ou ressurreição, porque está esquecido no mundo inteiro, tendo sido retirado dos calendários cristãos e só sendo festejado aqui entre nós — foi introduzida por um senhor chamado José Pacífico de Moraes, por apelido Bicas, que, vendo no Anil dois bois de matraca, mandou-os dançar no João Paulo e iniciou o costume de ali reunir todos os anos os bois, porque não era permitido pela polícia Bumba-Boi entrar na cidade, para não causar desordem. Os bois eram tidos como brincadeira de caboclo e a cidade, preconceituosa, não os deixava descer.
Sabem quem acabou com essa ordem? Fui eu, em 66, governador do Estado que adorava os Bois e os acompanhara na mocidade, quem mandei que brincassem na cidade inteira. Para começar, trouxe o primeiro para dançar no Palácio do Leões. Roseana herdou esse gosto pelo Bumba-Meu-Boi e pelos folguedos populares.
Chego aqui e me dizem que o mês, mais uma vez, foi triste. O povo gostaria de acompanhar o Boi mas está com medo de sair de casa diante de tanta violência: essa atinge marcas tristes, que colocam nossa cidade como uma das mais violentas do mundo.
Valei-nos São João, São Pedro, São Marçal e também dois santos de junho que são muito invocados pelo povo, Santo Antônio, o casamenteiro, o pregador, de Pádua e de Lisboa, e São Paulo, festejado junto com São Pedro desde o princípio da Igreja, motivo porque figurava na cerimônia de compadre dos velhos tempos.
E continuo pensando que São Marçal talvez esteja incluído como bombeiro para apagar os excessos dos fogos de São João, fogueiras, busca-pés, foguetes e agora a pólvora dos revólveres, das pistolas e das espingardas que estão dominando a cidade.

José Sarney

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