AULAS DE CANTO.
(Aderaldo dos Santos Alves, APLAC)
No dia 19 do mês fluente, a Academia Pinheirense de Letras, Artes e Ciências – APLAC – comemora o centenário de nascimento do patrono da cadeira n° 39 do sodalício.
Reverenciamos, merecidamente, Frei José Preziosa, MSC. Ele que será sempre lembrado como sustentáculo inabalável, sentinela hercúlea, degladiador incansável, administrador eficiente, mestre provecto, religioso dedicado e servo do Senhor consagrado.
Natural da cidade de Bisceglie, província de Bari, no sul da Itália, Frei José era membro da Congregação dos Missionários do Sagrado Coração (MSC). Foi um dos nove missionários, que desembarcaram no Porto da Faveira, em 15 de agosto de 1946.
(Residência dos MSC em Pinheiro, onde viveu e faleceu Frei Jose. Foto: Sandra Mendes)
Amou tanta as novas plagas e o novo campo de evangelização, que recebeu, em novembro de 1969, o título de Cidadão Pinheirense. Apaixonado pelo novo país, foi naturalizado brasileiro pelo Ministério da Justiça, através da portaria n° 7.746, de 15 de dezembro de 1983. Ao ensejo das comemorações do jubileu de ouro do Colégio Pinheirense, em 2003, foi-lhe outorgado o título de Cidadão Maranhense, pela Assembleia Legislativa do Estado.
Quantas reminiscências se nos acorrem. Os corredores, as salas de aulas, todas as dependências do então Ginásio, hoje Colégio Pinheirense, que o atestem! Nesse clima, ao correr do tempo e do espaço, vem-me à lembrança a figura singular de Frei José na batuta segura do seu solfejo, no ímpar comando do canto orfeônico e na precisa maestria das melodias agradáveis que preenchiam nosso ardor varonil.
O nosso professor era um italiano pequeno, gorducho, de olhos azuis como um céu tranquilo. Um europeu que jamais deixara de arrastar as palavras portuguesas, desprezando um pouco as nossas complicadas regras de gramática.
Jamais podemos dizer que era um professor mau. Apenas, severo. Temido porque prometia z-e-r-o, com facilidade. Não temos, no entanto, a menor queixa dele!
Guardamos, ainda, com imenso carinho, as recordações das aulas do canto, no então “Ginásio Pinheirense” e, também, no “São Tarcísio”.
Para sermos fidedignos à verdade, a matéria não era lá muito querida. Os colegas achavam-na difícil e só tentavam decorá-la para as provas. Tínhamos um pouco de facilidade ou, queda, talvez porque almejávamos seguir a vida religiosa tanto quanto se movido pelas melodias que sempre nos atraíram.
Às vezes, quando o professor tentava explicar compassos e bemóis, nós nos desforrávamos, fazendo barulho. E, então, célere, Frei José Preziosa MSC franzia a testa, com os olhos brilhando atrás das grossas lentes dos seus óculos, procurando restabelecer a ordem. Ora, éramos a única -- e primeira – turma mista do saudoso Ginásio Pinheirense daqueles tempos, idos tempos...
-- Um momento! Um momentinho!
Mas, também, tínhamos nossas brincadeiras. Quantas vezes, vendo-o risonho, púnhamos a cantar, aproveitando a música do “Seu Joaquim”:
Lá vem Frei Juca – ca
Da perna torta – ta
Dançando valsa – as
Com sua sanfona – na...
Cremos que, para nós, o melhor da aula era o solfejo. Como gostávamos do “Cachorrinho está latindo...”:
dó – dó – fá – mi -- ré – dó – fá – mi – ré – dó -- fá – mi -- fá -- fá – sol – ré – ré – sol – fá – mi -- ré – ré – dó – si -- dó – si – dó – ré – mi – fá.
Agradabilíssimas eram as aulas em que o austero Frei José trazia a vitrola e nos deliciava com trechos de Beethoven, Straus, Mozart, Chopin e outros. Ficávamos ouvindo a harmonia encantadora dos grandes mestres e, olhando através da janela, lá em baixo, a natureza inteira compondo outra sinfonia , mais divina e inebriante: os pastos verdejantes que se estendem intermináveis, tapetes com que Deus cobre, dadivosa e abundamente, a terra de Pinheiro, nosso torrão natal; ou as águas mansas dos campos, misteriosas e fascinantes no intimo dos recônditos dos seus segredos insondáveis, rutilando sob os beijos ardentes do sol, numa apoteose triunfante de luz.
E nós, ouvindo a música do disco, escutávamos os acordes suaves e maviosos de todos os nossos babaçuais, aconchego onde o vento se embala, carinhosamente, soluçando suas canções de amor... Ouvindo, em síntese, a prece silenciosa que cada palmeira murmura com os braços, eternamente erguidos ao céu, adorando e glorificando a Deus e agradecendo-Lhe as dádivas com que culminou a terra pinheirense...
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OBSERVAÇÃO: Giuseppe (José) Preziosa, patrono da cadeira 39 da APLAC, religioso da congregação dos Missionários do Sagrado Coração, nasceu na Itália em 19 de janeiro de 1921. Fez parte do primeiro grupo de padres italianos que chegaram em Pinheiro no dia 15 de agosto de 1946. Educador exímio, trabalhou incansavelmente para erradicar o analfabetismo na cidade de Pinheiro-MA. Por ocasião do transcurso dos 100 anos do natalício deste baluarte da educação pinheirense, a APLAC lança uma série de publicações intituladas "Lembranças de Frei José Preziosa", como uma das formas de celebrar a efeméride do centenário do nascimento do homenageado.
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