sexta-feira, 9 de junho de 2023

O FIM DAS PROFISSÕES

  (... haja progresso)

 Já há algum tempo, leio a respeito do ChatGPT. E, há poucos dias, em uma dessas leituras, decreta o especializado articulista o fim de uma série de profissões.

  Isso me levou a " viajar" à minha infância, em que testemunhei profissões, que sumiram, sem deixar vestígios e sem sofrerem influência alguma dessas três letrinhas famintas.

  E, a primeira visão a me tomar foi a oficina, que ficava em frente a minha casa. Ali, numa atmosfera sufocante, o respeitado mestre Artur, "se banhava, ao se desmanchar em  suor", ao ritmo bufante da voracidade do fole, que soprava invenções e ia forjando gadanho, prego, machado, martelo, foice, faca, facão e mil outras peças, a fim de socorrer, principalmente, o homem do campo. O certo é que a voraz e inumana indústria "papou" o ferreiro. E, muito faminta, comeu também o sapateiro, que não resistiu a ela, que "passou a vomitar" calçados aos milhares.

  O carroceiro e o vaqueiro, há muito, caminham para a extinção. De verdade, a duras penas sobrevivem esses dois profissionais. E   leva vantagem, se se pode dizer isso, o último, que "se modernizou" e passou a "campear" com outros cavalos. Uma Twister CB 250. Afinal, não há razão par "se lambregar" com o suor equino.

  E, ironicamente, por falar em "se lambregar",  sumiu o oleiro, com a matéria mais sagrada, a moldar os tijolos e as telhas; e, em especial, se fazer atender as necessidades, mais diversas, dos baixadeiros.  Potes, bilhas, alguidares, travessas, terrinas, filtros, gamelas (...) Não se pode esquecer da jóia maior de suas produções, o pinico ou urinol. Artigo, inclusive, que chegou a se tornar "um luxo". Produto caro e infalível indicador do poderio econômico das famílias.

  E, também, "um artigo de amor". Senão vejamos. Muito ouvi, de meu tio Zé Pessoa, que a sua amada Pituca tornou-se uma tristeza só, chegando a "uma depressão", por ter o maior sonho destruído, em duas tentativas, que ele fez, em lhe presentear com uma bem furnida e imponente peça. Mas, "o pinico" nunca chegou. É que, para o seu desespero, as duas tentativas, sim, se revelaram frustradas. Ainda que todos cuidados fossem tomados, no ato da embalagem, com um número absurdo de folhas de bananeira, tão valioso e ansiado presente lhe fez "a mais cruel desfeita". É! Rachou-se. Destruiu-se, e destruiu "a vontade de ter", durante o traiçoeiro trajeto do Trazino, o artífice, ao abençoado ninho de amor. Culpa, meu bom Deus, das incontáveis paradas,  para muitas e muitas doses de São João da Barra, e dos solavancos, provocados pela "passada dura" do  cavalo. Aí, toda e qualquer esperança foi sepultada. Assim, só restou a Pituca (...)

   Já, em definitivo, sumiu, e para sempre, o condutor do carro de boi, que, "sem dó e piedade, foi engolido" por caminhões,caçambas, "caminhonetas", tratores; e o parteiro. Que se entenda bem. O parteiro! E, como bem define o tio Bobo, "o parteiro macho". Figura de suma importância, em nossa região, e que será assunto para outra prosa.


     Zé Carlos Gonçalves

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