O ex-presidente
da República, José Sarney, concedeu uma entrevista exclusiva à revista Maranhão
Hoje, publicada na edição de outubro, que está nas bancas. O mais ilustre
maranhense na política brasileira aproveitou para recordar os momentos mais
marcantes de sua campanha para governador do Maranhão em 1965. Ele mostra que
era o Maranhão de cinquenta anos atrás e as principais realizações do seu
governo. O peemedebista fala que se o estado mudou e essa mudança foi promovida
por ele, afinal não existia asfalto, energia elétrica, água encanada para
população.
Sarney
foi eleito dia 03 de outubro de 1965, pondo fim a trinta anos do Vitorinismo,
como era conhecido o movimento liderado pelo ex-senador Victorino Freire, seu
mais ferrenho adversário. A edição de outubro da Maranhão Hoje traz um
excelente material sobre esse pedaço da história no estado, a reportagem
completa você pode conferir na edição impressa disponível em vários pontos de
venda pelo Maranhão.
Confira a
entrevista na íntegra:
Maranhão
Hoje – Naqueles tempos de comunicação precária, de estrutura de transporte
limitada, como foi possível chegar com sua mensagem de candidato a governador a
todas as regiões do Estado?
José
Sarney – As três campanhas a deputado federal possibilitaram-me divulgar, no
Maranhão inteiro, uma nova mensagem de mudança da situação de atraso do Estado. Dois
anos antes das eleições para governador, eu já era apontado como candidato
natural, reconhecido como o político que desejava mudar o Maranhão. Percorri
quase todos os municípios do Estado de jipe, teco-teco, canoa, cavalo e até a
pé, como o fiz indo de Axixá até Morros.
Que
passagem desta campanha lhe traz mais recordações (boa ou ruim)?
Como os
tempos mudaram, e o Estado passou a ser outro, a recordação que trago daquela
campanha foi, como se dizia, a de ter sido a mais empolgante campanha política
que o Maranhão já tinha vivido até então. Eu era recebido com uma verdadeira
consagração em todos os lugares que visitava.
O senhor
destacaria algum caso pitoresco, impossível de esquecer, que tenha ocorrido
durante a disputa de 1965?
Lembro-me
de uma saudação de Alcides Sarmento em um comício: “Quero saudar a ilustre
comandita [comitiva] que hoje nos visita” e, na sequência da saudação,
referindo-se ao Coronel Pedro Bogéa: “o maior reprodutor [produtor] do Mearim”.
Depois, no dia da eleição, colocaram no muro do cemitério a seguinte mensagem,
assinada pelos mortos: “Agradecemos por não ter de participar desta eleição”.
Havia muita fraude eleitoral, com votos de fantasmas, e a revisão eleitoral
acabou com essa prática. Daí o agradecimento dos mortos. Num comício de
que participei, em Bacabal, iluminado como se usava, naquele tempo, por
petromax, que chiava durante todo o tempo em que ficava aceso, um orador
começou a elogiar-me e, depois, não encontrando outra maneira de intensificar
seus elogios, disse o seguinte: “O Dr. Sarney é como os áudios sonoros desse
petromax.” Também não posso esquecer o que podia ter resultado numa grande
tragédia: íamos para o último comício em Bacabal, e o meu carro ficou atrás de
um caminhão, que, repentinamente, parou na estrada, com as luzes apagadas. Nós
iríamos colidir com sua traseira. Só não aconteceu o pior porque gritei ao
chofer que desviasse do caminho. Aí ele viu o caminhão, que estava parado
adiante. Bruscamente, desviou o carro, roçando a lateral do caminhão, e fomos
parar no mato da beira da estrada, que era de terra e bem estreita. Até
hoje lembro esse fato e sei que foi a mão de Deus que evitou que a minha
carreira política se encerrasse naquela noite.
Quantos
eram os coordenadores de sua campanha e quais o senhor considera que tiveram
papel mais decisivo no sucesso da eleição?
Não
tínhamos coordenadores escolhidos; havia movimentação de grupos que,
espontaneamente, se reuniam para fazer a campanha em todo o Estado. Mas se
tivesse que escolher um como o mais importante, eu destacaria o Amaral
Eletrônico, que, na organização dos comícios, era encarregado dos alto-falantes
que, naquele tempo, sempre apresentavam grandes problemas.
Alguns
nomes de destaque na política maranhense na atualidade não aderiram à sua
campanha, mas se tornaram seus aliados depois da posse. Alguns até passaram a
ter posição de destaque no governo. Como o senhor conseguiu se aproximar dessas
lideranças?
O meu
objetivo de governo era acabar com a política de ódio entre os adversários;
muitas vezes, havia até violência. Minha mensagem era de união, de paz, de
reunificação do Maranhão. Foi muito fácil, assim, atrair todas as lideranças:
as que tínhamos como nossas e as que me tinham combatido. Isso ocorreu depois
que eles viram o trabalho que eu estava fazendo no Estado.
Há uma
passagem interessante logo após sua posse que foi a inclusão do adversário
Victorino Freire na comitiva do presidente Castelo Branco numa visita a São
Luís. Como foi este reencontro de vocês?
Eu nunca
guardei ressentimento em minha vida. Nosso encontro foi cordial e com absoluto
respeito.
Qual era
o quadro social e econômico do Maranhão naquela época em que o senhor chegou ao
governo? Qual sua posição no ranking do PIB nacional da época?
A
situação do Maranhão era de extrema pobreza: sem estradas, sem energia
elétrica, sem escolas, sem hospitais, ou seja, de absoluta miséria. Basta
citar três exemplos: o Estado não tinha um quilômetro de estrada asfaltada, a
energia disponível era proveniente de quatro motores movidos a lenha de mangue,
e a distribuição de água era feita apenas no núcleo da cidade velha de São
Luís. Tínhamos o último lugar entre os PIBs estaduais brasileiros. Em meu
governo, crescemos 200%, triplicamos nosso PIB.
Muitos
dizem que seu governo foi beneficiado pelas obras federais: BRs, porto,
energia, universidade etc. O senhor concorda com esta análise?
Todas as
obras foram fruto de meu trabalho junto ao Governo Federal — estrada, porto,
energia elétrica, universidade. Elas não vinham por acaso. Foram conseguidas por
mim, pela expressão que eu já tinha naquele tempo, depois de ter sido, na
Câmara dos Deputados, Vice-Líder da Banda de Música da UDN e Vice-Presidente da
UDN nacional, enfrentando muita resistência e tendo muito trabalho.
A sua
campanha, de alguma forma, recebeu manifestação declarada de apoio do governo
federal, à época já sob o regime militar?
Não. O
regime militar não participou da eleição no Maranhão. Ao contrário, eu era
acusado, perante os militares, de esquerdista e de candidato do partido comunista.
Por que o
regime militar tentou cassar o seu mandato? Antônio Dino, seu vice, teve papel
decisivo para que este plano dos militares fosse abortado?
Esse
episódio ocorreu depois da edição do AI-5, mas nunca houve uma ação concreta
nesse sentido. O que ocorreu e que determinou esse receio foi o fato de eu não
ter concordado com a edição do AI-5.
Como vê o
Maranhão, hoje, comparado ao que o senhor encontrou ao tomar posse em 1966?
Hoje o
Maranhão mudou, e mudou com a ajuda de minhas mãos. O mais importante foi a
transformação das mentalidades: em vez de discurso da política do delegado e do
coletor, passou-se ao discurso político do desenvolvimento.
O senhor
detesta quando ouve alguém falar mal do Maranhão, principalmente quando é
maranhense, não é verdade?
A
campanha de falar mal do Maranhão foi feita pelos maus maranhenses que, para
combater-me, passaram a denegrir a imagem do Estado. O Maranhão, hoje, é o 16º
Estado do Brasil, à frente de Mato Grosso do Sul! Portanto, é um Estado com
números significativos! É o 2º porto do Brasil!
Curioso
que muitos que falavam mal do Maranhão hoje estão no poder e querem mostrar
agora para o Brasil e o Mundo o potencial do Estado, ou seja, escondem o que
sempre diziam ser verdade. Falaram demais e de forma errada?
Os que
falavam mal do Maranhão são os mesmos que faziam campanha nacional contra mim e
o Maranhão. Agora têm de morder a língua.
Como o
senhor pretende ser lembrado pelos maranhenses?
Como o reformador
do Estado do Maranhão e renovador da sua tradição: a da política, sendo o
primeiro Presidente da República do Estado; e a da intelectualidade, sendo
membro da Academia Brasileira de Letras, com 165 livros publicados.
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