Pacientes esperam atendimento no Hospital Genésio Rego, na capital maranhense. Foto: Diego Emir/Estadão
O Maranhão é o Estado brasileiro com a menor expectativa de vida ao nascer – um recém-nascido lá hoje pode esperar viver 12 anos a menos do que se fosse catarinense. Mas isso não comoveu os gestores públicos que, em outubro deste ano, foram presos sob a acusação de terem desviado verba destinada para a compra de remédio e equipamentos para vários hospitais públicos de São Luís.
Segundo a Polícia Federal, um cheque de R$ 15 mil chegou a ser usado para comprar vinhos importados em uma adega de luxo em área nobre da capital maranhense. No total, mais de R$ 600 mil foram sacados das contas de treze unidades de saúde por dois gestores da organização social Instituto Cidadania e Natureza (ICN) com acesso às verbas federais. Enquanto isso, a situação nos hospitais de onde o dinheiro foi desviado é calamitosa.
A PF investiga o desvio de recursos públicos federais do Fundo Nacional de Saúde, destinados ao Sistema Único de Saúde no estado do Maranhão. A Operação Sermão dos Peixes apura desvios durante a administração de Ricardo Murad, cunhado da ex-governadora Roseana Sarney (PMDB), na Secretaria Estadual de Saúde.
No Hospital Presidente Vargas, especializado no tratamento de HIV, tuberculose e doenças tropicais, a infraestrutura antiga e mal conservada foi motivo para uma das maiores crises na saúde pública do município neste ano. Também em outubro, uma falha no sistema de oxigênio que alimenta a Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do hospital causou a morte de três pacientes.
Desde então, a UTI teve de ser fechada e os pacientes foram transferidos para outro hospital da capital. O Ministério Público do Maranhão constatou o problema e investiga o caso. Mas também faltam leitos comuns no Presidente Vargas. Hoje, os seis leitos masculinos de tuberculose, outros seis de doenças tropicais e nove de HIV estão ocupados. Quem chega necessitando de atendimento é orientado a procurar outro hospital.
Outra unidade que teve dinheiro desviado foi o Hospital do Câncer do Maranhão. Um paciente que preferiu não se identificar reclamou que há falta periódica do seu medicamento. Ele está tratando um câncer no estômago e contou à reportagem que a falta do remédio ocasionou a suspensão das sessões de quimioterapia. Já quem depende da radioterapia para tratar o câncer na capital maranhense entra em uma fila de espera de quase mil pessoas.
“Apesar de curiosa, a leitura do cheque (gasto na adega de vinhos) demonstra que enquanto a população sofria com um sistema de saúde precário, os investigados se davam ao luxo de utilizarem dos recursos públicos repassados ao ICN para o custeio de despesas numa adega de vinho, o que robustece ainda mais os indícios de que os gestores do ICN tratavam as verbas públicas como se deles fosse”, diz o relatório da PF.
Nordeste. O levantamento feito pelo Estado nos dados do Ministério da Transparência mostra que cerca de 46% das operações de fiscalização foram feitas no Nordeste. Segundo a pasta, parte desse fenômeno pode ser explicada pelo volume de recursos federais que são enviados para municípios dessa região. “Além disso, nas regiões Sul e Sudeste tem muitos órgãos públicos (de fiscalização). Por isso, fiscalizamos mais no Nordeste”, afirma o secretário-executivo do ministério, Wagner Rosário.
Em números absolutos, Minas Gerais, o Estado com maior número de cidades no País, teve também a maior quantidade de municípios envolvidos em desvios. Foram 163. O Estado é seguido por Bahia, 99, e Alagoas, 70. São Paulo teve 26 cidades investigadas, a maior parte na Operação Sanguessuga – investigação que mirou no fornecimento fraudulento de unidades móveis de saúde, veículos de transporte escolar, unidades itinerantes de inclusão digital e equipamentos médico-hospitalares a prefeituras municipais de todo o Brasil.
COM A PALAVRA, O GOVERNO DO MARANHÃO
A respeito da reportagem “Verba de hospital no Maranhão foi gasta com vinho”, de O Estado de S. Paulo, 25 de dezembro, o governo do Maranhão esclarece:
1 – Infelizmente, o texto omite a relevantíssima informação de que os supostos fatos narrados ocorreram no governo passado e não no atual;
2 – A matéria também afirma que pacientes morreram por problemas de oxigênio em um hospital, quando a conclusão dos laudos técnicos dá conta de que as mortes não foram decorrentes desta causa;
3 – Sobre o Hospital Presidente Vargas (HGV), é fato verdadeiro que ele se encontra em reforma e, por isso, os pacientes foram transferidos naquela ocasião para espaço adequado de outra unidade de saúde, o Hospital Carlos Macieira. Quanto ao funcionamento do Hospital Presidente Vargas, não houve e não há recusa de atendimento aos pacientes. Pelo contrário, todos que chegam à unidade são acolhidos e atendidos normalmente;
4 – Sobre o hospital do Câncer, a reportagem se utiliza de suposta “fonte (paciente) que preferiu não se identificar”, o que torna impossível a verificação da situação específica e qualquer manifestação do governo a respeito;
5 – Sobre o tratamento de radioterapia, o atual governo já dobrou a capacidade de atendimento e em 2017 vai ampliar ainda mais, mediante convênio celebrado há alguns meses com o Hospital Aldenora Bello, viabilizando a aquisição de um novo acelerador linear;
6 – Reiteramos o empenho do atual governo do Maranhão em superar as dificuldades herdadas, como é público e notório, bem como de enfrentar graves problemas nacionais, a exemplo do sistema de saúde
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