Aymoré
Alvim, AMM, ALL, IHGM, APLAC.
Corria o ano
de 1964. Eu fazia o quarto ano médico e era acadêmico plantonista, na equipe do
Dr. João Abreu Reis, no Pronto Socorro de São Luís. Na época, era o único que
existia para toda a Ilha. Era um prédio de dois pavimentos que ficava à Rua do
Passeio esquina com a Rua da Palha, em frente ao atual prédio do SENAC.
Numa noite,
chegou por volta das 23 horas uma senhora, moradora numa das palafitas do
Bairro do Matadouro pedindo socorro para o marido.
Dr. João
Abreu veio atendê-la: De que se trata?
- “Ah!
Doutor, meu marido comeu, dois dias atrás de noite, um peixe e disse que uma
coisa engatou no “gurguminho” dele. No começo, a gente pensou que era caroço de
farinha no “goto”. Aí ele bebeu água, comeu uma banana e falou que melhorou.
Mas, que nada, doutor. Hoje de manhã ele foi fazer precisão e não pôde. Se
espremeu e saiu sangue. Daí pra cá esse homem não ficou mais de pé nem sentado
e nem deitado. É todo tempo de boi e só gemendo. A gente já fez de tudo, mas
ele diz que uma coisa tá presa nas partes de saída dele e fura. Só se é uma
espinha. Hoje na “boquinha da noite”, eu fui ver. Senhor, o homem já tá é com o
“cesso” quase todo de fora. Aí eu fiquei com medo e vim pedir socorro”.
- Mas,
“cesso”, que é “cesso”, minha senhora?
- “Ah!
Doutor, é o cesso, o forro do cu. É uma bolota vermelha já escura que tá saindo
das partes dele”.
-Ah! Já deve
estar fazendo prolapso de mucosa retal.
- O que,
doutor?
- Nada,
deixa pra lá. Aymoré, pega a ambulância e traz pra cá o paciente.
Chamei seu
Nemésio motorista e seu João enfermeiro. Colocamos a mulher na ambulância e
partimos rumo ao Matadouro.
Ao
chegarmos, o sujeito estava de quatro sobre uma mesa, no meio da pequena sala .
- “Que
diabo, mulher, tu demorou demais”.
- “Pera aí,
Marcolino, não chama o nome desse renegado dentro de casa. O doutor já veio te
buscar”.
- “Pra lá
não vou”.
- “Como é
que tu não vai, homem de Deus? O doutor vai te operar pra tirar essa espinha de
ti”.
- Não vou.
Como é que eu vou ficar nessa posição la no Pronto Socorro. Tu queres me
desmoralizar, mulher?.
- Que seja,
mas tu vais.
Com alguma
dificuldade, o enfermeiro e dois outros homens da casa pegaram o paciente e o
puseram, na ambulância.
Ao chegar,
Dr. João Abreu examinou, fez os procedimentos indicados e o deixou internado
tomando medicação.
No plantão
seguinte, fiz o relato da evolução do quadro ao Dr. João Abreu, e ele observou
a regressão da inflamação e da procidência retal.
- Como vais
passando, Marcolino?
- Doutor, eu
estou muito bem. Só a "boca do escapamento" que ainda arde um pouco
quando vou fazer necessidade.
- Tudo bem.
Vou te dar alta e passar essa medicação para tomares ate acabar o vidro.
- Tá bem,
doutor.
- Rapaz,
toma cuidado quando comeres peixe. Espinha de peixe além de “remosa” quando não
engata na entrada, na saída é na certa.
- “Ah! Seu
doutor. Com essa eu me emendei. Obrigado e até logo”.
- Ou ate
nunca, Marcolino?
- É isso
mesmo, doutor. Não quero voltar mais aqui. Até! Aymoré Alvim
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